sexta-feira, 29 de dezembro de 2023

Diário pessoal, 29 de Dezembro de 2023 às 7:00pm

 A noite passada foi um mergulho profundo nos abismos dos meus próprios pensamentos imaginativos, a luta contra as correntezas de minhas rotinas insanas tentaram sugar minha vitalidade mental, emocional e física. Escrever é meu refúgio, mas as exigências diárias me arrancam pedaços, deixando apenas resquícios de energia para meu projeto literário pessoal. Ah, Thiago Cruz, meu comparsa do mundo na internet, há quantos anos nos conhecemos mas nunca nos encontramos? Aqui deixo para você meu agradecimento formal a citação reflexiva de C. S. Lewis sobre querer ser 100% original. Trocamos palavras e ideias que iluminaram as sombras que pairavam em meu romance. Conspirações literárias em meio aos bits e bytes.

A manhã de hoje me arrastou para uma rotina mundana da lavanderia. Roupas imundas foram purificadas, mas a chama criativa ardia apesar de ainda fraca. Uma escapada para almoçar revelou-se uma jornada inesperada. Um casarão que já foi templo dos video games agora é um restaurante, mas eu o contemplava como um portal para o passado. Engoli o almoço devagar, não pela qualidade da comida, ela não era nem diferencialmente boa, maravilhosa e diferenciada ao ponto de saborear como se hoje fosse o ultimo dia da minha vida, ou que ela fosse ruim, feita com raiva ou aterradora ao ponto de empurrar vagarosamente goela a baixo como se não houvesse mais comida em lugar algum deste mundo. Mas pelo ambiente que gritava com lembranças tão vividas que a impressão vigente era a de que eu tinha voltado aos meus quatorze (14) anos de idade. O teto, uma incógnita do tempo, não me parecia igual, mas também não aparentava estar totalmente diferente, a sensação de nostalgia me envolveu como um doce feitiço. Quem mais, neste vasto reino terreno, ousa fazer o que fiz hoje? Quem se importa com cada momento vivido ao ponto disso influenciar as próprias atitudes?

O caminho de volta para casa foi uma jornada através de antigas trilhas, recordando passos que um dia foram mais leves e frequentes. Sob um céu ameaçador, não me apressei, eu não temia a chuva. A cada passo, o estudante do passado caminhava ao meu lado se afogando em recordações. Diante da escola agora reduzida a um terreno baldio, a lembrança das aulas de educação física ecoou naturalmente. A escola era pequena, não havia um espaço adequado para atividades físicas, como resultado disso, um bando de alunos conduzidos à delegacia para os exercícios, como delinquentes mirins rumo ao cárcere, quem não pensaria dessa forma ao se deparar com uma fileira de jovens fardados transpassando em fila indiana a saída da escola e a entrada do recinto daquele calabouço rumo ao pátio. Emoções ressurgiram, uma viagem no tempo, curta, mas intensa.

Nada de extraordinário depois disso, exceto pela chuva que, como uma sentença tardia, desabou dos céus muito tempo após eu chegar em casa. Em Belém do Pará, o comum é a chuva ameaçar e, eventualmente, nem se quer cair. A noite avança, e eu, me preparo para mergulhar nas profundezas dos meus devaneios. Um dia morte pairará sobre mim como a sombra de um bando de urubus, provocando em mim reflexões sobre a natureza efêmera da vida. Isto me induz a refletir que cada experiência enterrada na cova do chão frio faz com que se perca algo muito além de um mero corpo desprovido de sua mais valiosa benção. Isso acende em mim a urgência de registrar essas memórias, mesmo que o mundo ignore a sinfonia dos meus pensamentos.

Não é por esperar que alguém se aventure a decifrar minhas palavras, mas pela importância intrínseca de preservar o tecido do que fui, como se de alguma forma eu quisesse ser eterno, ou ao menos me aproximar da eternidade terrena. Quando a cortina do meu tempo se fechar, quero deixar para trás mais do que sombras fugazes. Julgo que cada vivência de cada ser vivo senciente é uma página dourada no livro da existência. Reflito sobre o vazio que se forma quando uma alma parte, levando consigo um tesouro de experiências, aprendizados e momentos únicos. Star Trek encontrou para isso uma solução na cultura Vulcana com a preservação do Katra daqueles que se vão. Cada instante, mais valioso do que o ouro que muitos cobiçam.

Esta ânsia de eternizar o efêmero, talvez seja a maldição e a bênção dos que, como eu, vagam entre as linhas escritas do tempo. Escrever é meu elixir, uma tentativa de enganar a finitude, de mascarar as dores de dias que aparentam nunca ter fim, de rotinas que nos diminui para algo infinitesimalmente menor do que realmente somos ou deveríamos ser. Que essas palavras resistam ao esquecimento, uma pequena revolta contra o silêncio que segue a partida. Quando o pó se assentar sobre meu nome escrito numa lápide, que estas palavras ecoem através do tempo, não como um lamento, mas como um sussurro persistente de tudo que vivi, desafiando o esquecimento inevitável.

Agora, encerro este relato, pronto para mergulhar novamente no meu estranho romance. O diário é a tinta da minha alma, a narrativa de um "Yoz" perdido nos meandros do tempo.

Fim do diário pessoal

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